A indústria moçambicana está diante de um dos maiores desafios das últimas décadas. A multinacional Mozal, referência continental na produção e exportação de alumínio, lançou um alerta sério: poderá encerrar as suas operações no país até março do próximo ano, caso não consiga chegar a um entendimento com o Governo sobre a renovação do contrato de fornecimento de energia elétrica. O anúncio acende um sinal vermelho não só para a indústria de transformação, mas para toda a economia nacional, que depende fortemente da atividade da empresa.
Segundo a South32, acionista maioritária da Mozal, o impasse nas negociações dura há mais de seis anos. O contrato atual, que expira em março de 2026, envolve um acordo complexo de fornecimento de energia da Hidroelétrica de Cahora Bassa (HCB) para a estatal sul-africana Eskom, que por sua vez revende à Mozal. Contudo, a atual crise energética provocada pela seca reduziu drasticamente a capacidade da HCB, que hoje só consegue fornecer 350 megawatts, muito abaixo dos 950 megawatts necessários para manter a fundição em plena operação.
O presidente do Conselho de Administração da Mozal, Samuel Samo Gudo, revelou que parte do equipamento da sala de fundição já está a ser desmontado como medida preventiva, e que investimentos futuros foram suspensos até que haja clareza no fornecimento e no custo da energia.
“Sem um contrato de energia renovado e viável, manteremos a fábrica apenas até o fim do contrato atual. Depois disso, passaremos para um regime de manutenção e preservação. É uma decisão difícil, mas inevitável se não houver solução”, frisou Gudo.
O impacto de uma eventual suspensão seria devastador. A Mozal emprega diretamente cerca de 5 mil pessoas e sustenta mais de 27 mil postos de trabalho indiretos, absorvendo cerca de 30% da capacidade industrial da província de Maputo. A sua contribuição para o Produto Interno Bruto de Moçambique ronda 3%, além de gerar receitas significativas para o Estado.
Em 2022, a Mozal pagou 839,8 milhões de meticais em dividendos ao Estado moçambicano, detentor de 3,9% das ações. Esse valor caiu para 274 milhões em 2023, e em 2024 não houve distribuição devido aos prejuízos registados.
O diretor executivo da South32, Graham Kerr, destacou que cerca de 30% do custo de produção do alumínio é absorvido pela eletricidade e 50% pela matéria-prima, adquirida no mercado internacional. Uma alteração significativa no preço da energia poderia tornar a operação “economicamente insustentável e internacionalmente não competitiva”.
Ainda assim, a empresa mantém uma ponta de otimismo. “Continuamos a negociar com o Governo moçambicano e esperamos alcançar um acordo que permita manter a Mozal ativa para além de 2026, preservando empregos e investimentos no país”, afirmam os acionistas.
Entretanto, os próximos meses serão decisivos. Caso não haja consenso, Moçambique poderá assistir ao encerramento de uma das suas maiores indústrias e a um abalo profundo na sua economia, num cenário que especialistas já classificam como “o maior teste à relação entre energia e desenvolvimento industrial do país nas últimas décadas”.