Em Mogovolas, província de Nampula, o que parecia ser o início de uma viragem institucional no combate à corrupção e criminalidade dentro das forças policiais, transformou-se num novo capítulo de indignação e incerteza. Apenas três semanas após terem sido detidos, cinco membros da Polícia da República de Moçambique (PRM), incluindo o comandante distrital, o chefe das operações e três agentes, foram libertados e regressaram às suas funções no mesmo distrito onde são acusados de integrar uma rede criminosa.
O caso, que envolve acusações sérias como proteção a redes de garimpo ilegal, intimidação de empresários locais e facilitação de outros crimes desde 2024, chocou a opinião pública pela forma célere como os suspeitos foram reintegrados nas estruturas da PRM — sem transferência, suspensão ou requalificação.
Durante a conferência de imprensa que anunciou a libertação, o porta-voz do Tribunal Judicial de Nampula justificou a medida com base na aplicação de “termo de identidade e residência”, sustentando que os suspeitos não apresentavam risco de fuga ou de influenciar a investigação.
Mas a versão judicial não convenceu a comunidade local, que vê o regresso dos agentes como um potencial entrave à própria justiça. Fontes próximas ao processo alertam que os cinco voltaram a ter acesso irrestrito a documentos, canais de informação e contactos estratégicos — os mesmos que, segundo os autos, teriam usado para cometer os alegados crimes.
“É incompreensível. Como é que alguém acusado de usar a farda para cometer crimes continua a usar a mesma farda, no mesmo lugar?”, questiona uma fonte próxima ao processo, sob anonimato, por medo de retaliações.
O sentimento de frustração e descrença nas instituições é visível nas ruas de Mogovolas. Pequenos empresários que foram alvos de extorsão durante os últimos meses relatam que a presença dos mesmos agentes instala um clima de medo, além de levantar dúvidas sobre a seriedade da investigação.
“Celebrámos a prisão deles como um sinal de justiça, mas agora parece que tudo foi em vão. Voltaram como se nada tivesse acontecido”, diz um comerciante local, sob anonimato.
Instado a comentar o caso, o Secretário de Estado da Província de Nampula, Plácido Nerino Pereira, adotou um tom cauteloso. Disse que o regresso dos agentes é uma matéria da alçada judicial e que qualquer análise requer acesso completo ao processo em curso.
“O que deve ser analisado é por que foram libertados, se havia ou não provas. Como voltaram a trabalhar e porquê voltaram a trabalhar. Ficou provado? Não ficou provado?”, disse o governante, evitando juízos prévios.
Plácido Pereira reforçou que cabe às instâncias judiciais esclarecer se a reintegração dos acusados tem base legal e não compromete a imparcialidade da investigação.
A decisão, contudo, levanta sinais de alarme sobre o estado do sistema disciplinar e da justiça em Moçambique, especialmente quando os suspeitos continuam a exercer poder efectivo nas mesmas funções e geografias onde, segundo a investigação, operaram ilegalmente.
A sociedade civil e algumas organizações locais exigem medidas urgentes de contenção e transparência, sob pena de minar a confiança pública nas instituições policiais e judiciais do país.