A sala estava repleta de autoridades locais, mas o silêncio pesava como chumbo. Diante de comandantes e chefes de esquadra, o Procurador-Geral da República, Américo Letela, não poupou palavras nem metáforas: a corrupção dentro da Polícia moçambicana é um inimigo interno que ameaça a segurança pública e coloca a soberania nacional em xeque.
Durante a sua visita oficial à província de Inhambane, Letela fez questão de reunir-se com membros da corporação policial, dirigentes governamentais, representantes judiciais e outras entidades estratégicas. No centro da sua mensagem, estava uma denúncia preocupante: a facilidade com que cidadãos estrangeiros têm conseguido documentos moçambicanos — bilhetes de identidade, passaportes e outros títulos oficiais.
“Um documento de identificação não é apenas um pedaço de papel; é a chave de entrada a um país, é a identidade de uma nação. Quando cai em mãos erradas, não é apenas a segurança de Moçambique que está em risco, mas também a confiança de todo o povo”, afirmou o Procurador-Geral, com tom firme.
Segundo Letela, a corrupção infiltra-se de forma silenciosa, mas devastadora, corroendo os alicerces das instituições. O ato de facilitar, mediante suborno ou favorecimento, a emissão de documentos a estrangeiros não qualificados é mais do que um crime administrativo — é uma ameaça direta à soberania.
A vulnerabilidade nos mecanismos de controlo é preocupante. Num cenário global de redes criminosas transnacionais, um passaporte moçambicano falso pode ser usado para traficar drogas, armas, pessoas ou até financiar grupos terroristas.
“Quando o crime se instala dentro de quem deveria combatê-lo, não temos apenas uma falha no sistema — temos um sistema falhado”, acrescentou Letela.
A missão do Procurador-Geral não se limitou aos quartéis e esquadras. Letela percorreu penitenciárias, tribunais e procuradorias da província, num esforço para mapear as fragilidades do sistema de justiça.
Nessas visitas, verificou de perto problemas como superlotação das cadeias, lentidão processual, falta de recursos e insuficiente fiscalização interna. Para ele, combater a corrupção não é apenas punir, mas criar barreiras estruturais para impedir que o problema se repita.
Letela reforçou que o combate à corrupção exige também participação ativa da população, denunciando práticas ilícitas e não se deixando seduzir por “atalhos” ilegais para obter documentos ou benefícios.
O seu alerta ecoa num momento delicado para Moçambique, que enfrenta não apenas desafios económicos e sociais, mas também ameaças complexas ligadas ao crime organizado.
A mensagem final do Procurador-Geral foi clara: corrigir estas falhas não é apenas uma questão de segurança — é uma questão de soberania nacional.